quinta-feira, 21 de maio de 2015

Em busca da suástica perdida

Quando era muito novo, um amigo me deu um gibi do Capitão Marvel caindo aos pedaços, faltando folhas, sem capa e com arte-final "melhorada" na base da Bic. Enfim.

Foi uma das primeiras HQs que folheei na vida e, portanto, me marcou. A arte fabulosa e expressiva da época, as histórias nonsense do Capitão, Mary Marvel, Mulher-Bala e o Senhor Cérebro (a minhoca inteligente com um radinho), mas, principalmente, uma aventura do Capitão Marvel Jr. enfrentando o Capitão Nazi, vilão clássico da família Marvel.

Tive uma grande surpresa muitos anos depois, quando vi uma imagem do Nazi com a tradicional suástica estampada. Tinha a nítida impressão que o emblema do uniforme do Nazi que vi naquele gibi antigo era uma elipse totalmente preta, sem a suástica-raison d'être do fulano. Ou será que me enganei?

Sem a revista (que virou pó), sem referências, sem internet, joguei a questão pro almoxarifado, sem devolução. Mas graças a Ditko pelo Luwig, pelo Marlo, pelos Escapistas!

Estava catando referências para um post vindouro (o quão vindouro, não sei) e destrinchando lá a World's Finest Comics #258, de agosto/setembro de 1979. E dá-lhe Superman contra o Batman, Raio Negro contra a tensão racial, Arqueiro Verde contra a tensão social e toda aquela refestelância pseudo-política da Era de Bronze, quando chega a conclusão, numa aventura do Capitão Marvel Jr. enfrentando o Capitão Nazi...

Foi como rever um velho amigo que te deve duas rodadas de Sul Americana.

A história, ingênua como só a turma de Fawcett se permite ser, foi como uma suave brisa camp em meio ao clima brabo de pós-Vietnã que imperou na edição. Mas o principal é que foi o ponto de partida pra que eu acabasse com aquela antiga dúvida.

Felizmente, o que antes seria um pesadelo insolúvel - achar a edição nacional de uma historinha curta com referências próximas do zero - hoje é sopa no mel. Uma rápida triangulada no essencial Guia dos Quadrinhos e uma consulta ao fantástico Guia EBAL resolveu a questão.

E criou outras!





A HQ Shazam! O Livro do Ano de Super-Heróis 1981, foi publicada pela EBAL em, duh, 1981. O presidente João Figueiredo entrava em seu 3º ano de governo. A Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP) ainda estava com suas tesouras famintas. E um personagem de revista infanto-juvenil estampava orgulhoso uma suástica no peito.

Ainda hoje é notável os culhões de titânio da EBAL em publicar a história, mesmo com a maquiada sambarilove.

E foram curiosas também certas escolhas da tradução.


Na mesma página, onde o conceito de eugenia ariana escapa ileso, provavelmente por ato falho, o termo "führer" é suprimido, bem como as reclamações sexistas proferidas pelo Cap Nazi, típicas das HQs da época.

Em suma: nazismo não. E machismo também não!

O lendário Adolfo Aizen, dono da EBAL e russo naturalizado brasileiro, certamente teria um causo imperdível dos bastidores dessa história.

5 comentários:

Luiz Gustavo de Sá disse...

Dogg, essa "operação de resgate" foi como dar um rolé de cinco minutos num DeLorean! Tenho certeza que tanto esse escapista quanto os demais leitores vão querer um bis.

Independente da época, por estampar aquela suástica - vetada - no peito, e comportar-se como um supremacista truculento quase bem humorado, o Capitão Nazi nunca me encomodou tanto quanto um Caveira Vermelha, por exemplo.

Mais ou menos como o Sargento Steinhoff de Fury Max:

http://s10.postimg.org/sla59hgi1/fury_steinhoff455.jpg

Ou, o Dewey Crowder, um nazi de oitava cateoria em Justified:

http://img2.tvtome.com/i/u/4a183687cf2f49b7c94c5293b9c94823.jpg

Sobre o traço, interessante que as cores brazucas lembram bastante o estilo pop art, sem falar que se tu me dissesses que era o Brent Anderson, de Astro City, eu acreditava.








Marlo de Sousa disse...

Doggma, sua epopeia em busca de provas da própria sanidade (afinal, você não podia ter imaginado algo tão vívido em sua memória) me fez lembrar minha busca por um tema de comercial do Telecurso, lá no fim dos anos 70 ou começo dos 80.

Eu lembrava das imagens do Skylab, dos estágios de um foguete se soltando e de um trecho específico da música que sonorizava as cenas. Pensei, por lógica associação de estilo e época, que era alguma coisa do Kraftwerk, mas, quando baixar e ouvir a discografia do grupo não resolveu a questão, quase entrei em parafuso! (Embora tenha servido para encontrar outro tema recorrente na época que, afinal, era deles, mesmo: "Home Computer")

Pois fuça ali, fuça aqui, cheguei à bendita música: trata-se de "The Rise", do grupo de eletrônica italiano, em seu disco "Automat". Por alguns breves segundos, ali, a partir de 1:48, minha vida fez todo sentido!

https://www.youtube.com/watch?v=O-YbLgiXmtc

PS: esse Capitão Nazi é um fanfarrão! Fica feio dizer que torci por ele enquanto lia? =D

Abraço!

Marlo de Sousa disse...

Ops... Confusão textual aí acima. O grupo se chama Automat e o disco, também.

doggma disse...

Então Luwig, mesmo em se tratando de um personagem nazista (primo do Grande Mestre, vilão outro Cap? - http://en.wikipedia.org/wiki/Master_Man_(Marvel_Comics)), a DC foi firme em manter o clima pueril e ingênuo do universo da Fawcett Comics. E na contramão de todas as "Eras" e Crises - com exceção da última, em que a Mary virou uma dominatrix surtada e o Adão Negro devastou um país inteiro. heh

Marlo, essa sua descrição das cenas do Telecurso - E esse fantástico link do Automat - tocou vários sinos aqui. Uma sinaleira generalizada, aliás! Muito legal você ter descoberto essa. Eu também já tive meus perdidos & achados na terra do déjà vu:

http://blackzombie.blogspot.com.br/2012/04/eternia-psytrance-rave-party-84.html

A sensação realmente é atordoante. Parece que você não é um ser humano completo até resolver isso, rs.

Abraço!

Marlo de Sousa disse...

Dogg, essas (ótimas) músicas do desenho do He-Man já foram objetos de postagens minhas no Facebook, porque eu também saí feito louco tentando descobrir de quem eram. De fato, foi muito reconfortante encontrá-las! :)

Abraço!